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STF e a Inclusão de Empresas do Mesmo Grupo Econômico na Execução Trabalhista: Análise do Tema 1.232

 

Frederico Silva Hoffmann[1]

INTRODUÇÃO

O Supremo Tribunal Federal (STF) está prestes a definir, em sede de repercussão geral, um dos temas mais relevantes para o Direito do Trabalho na atualidade: a possibilidade de inclusão, na fase de execução trabalhista, de empresas pertencentes ao mesmo grupo econômico daquelas originalmente condenadas, mas que não participaram da fase de conhecimento do processo.

Trata-se do Tema 1.232, julgado no Recurso Extraordinário (RE) 1.387.795, interposto pela por uma empresa contra decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST). O caso despertou grande interesse, pois envolve diretamente os princípios constitucionais do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, em contraposição à necessidade de garantir a efetividade da execução trabalhista e a proteção do crédito alimentar do trabalhador.

 

A discussão central é: uma empresa que integra o mesmo grupo econômico pode ser chamada a responder pela condenação trabalhista de outra, apenas na fase de execução, mesmo sem ter participado do processo desde o início.

Tese a favor da inclusão (visão pró-trabalhador): defende-se que, por força do artigo 2º, §2º, da CLT, introduzido pela Reforma Trabalhista de 2017, as empresas integrantes de um mesmo grupo respondem solidariamente pelas obrigações trabalhistas, independentemente de participação prévia na ação. Assim, poderiam ser incluídas diretamente na execução, desde que lhes fosse garantido o direito de defesa posterior.

Tese contrária (visão pró-empresa): sustenta-se que a inclusão tardia viola o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, pois obriga uma empresa a pagar dívida decorrente de processo do qual não participou. Para que seja responsabilizada, deve ser incluída desde a fase de conhecimento, ou, em casos excepcionais (fraude ou abuso), via incidente de desconsideração da personalidade jurídica (IDPJ).

 

O JULGAMENTO NO STF

a.       Corrente majoritária — Inclusão restritiva (6 votos)

A maioria formada até agora entende que não é possível incluir empresa do mesmo grupo econômico apenas na execução, exceto em hipóteses de fraude ou abuso comprovados.

Os ministros que compõem essa corrente são: Dias Toffoli (relator), Cristiano Zanin, Flávio Dino, André Mendonça, Nunes Marques e Luiz Fux.

Seus fundamentos principais são:

  • A inclusão tardia viola o art. 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal, que consagram o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa.
  • O processo deve garantir que qualquer empresa potencialmente responsabilizada possa se manifestar desde o início, sob pena de insegurança jurídica.
  • Exceções só devem ser admitidas quando houver fraude ou abuso, aplicando-se o art. 855-A da CLT (incidente de desconsideração da personalidade jurídica) e os arts. 133 a 137 do CPC.

 

b.      Corrente minoritária — Inclusão direta possível (2 votos)

Os ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes sustentaram que a inclusão na execução é legítima, mesmo sem participação anterior, desde que assegurado o direito de defesa por meio de embargos à execução.

Segundo Moraes:

  • O afastamento da possibilidade de inclusão dificulta a efetividade da execução trabalhista.
  • Estruturas empresariais complexas podem ser usadas para blindar patrimônios, transferindo dívidas a empresas “vazias”.
  • O objetivo da Reforma Trabalhista de 2017 foi justamente reforçar a responsabilidade solidária entre empresas de um grupo econômico.

 

Apesar da maioria formada, o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, suspendeu o julgamento para buscar uma proposta intermediária entre as duas posições, evitando decisões extremadas.

IMPACTOS PRÁTICOS DA DECISÃO

Os impactos práticos do julgamento do STF sobre a inclusão de empresas de um mesmo grupo econômico na execução trabalhista são significativos e se manifestam em diferentes perspectivas. Do ponto de vista dos trabalhadores, a eventual consolidação da posição majoritária poderá dificultar a efetividade da cobrança de seus créditos. Isso porque, se prevalecer o entendimento de que apenas as empresas que participaram desde a fase de conhecimento podem ser responsabilizadas, o trabalhador terá de adotar maior cautela já na petição inicial, identificando e trazendo todas as sociedades do grupo ao polo passivo do processo. A consequência imediata é o aumento da complexidade das ações trabalhistas, que passarão a exigir investigações preliminares mais detalhadas sobre a estrutura societária e patrimonial das empresas envolvidas.

Para as empresas, o cenário se mostra duplo. Por um lado, a decisão garante maior segurança jurídica, pois impede que uma companhia seja surpreendida com execuções milionárias sem ter tido oportunidade de defesa durante todo o curso da ação. Essa previsibilidade reforça os princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, pilares essenciais em um Estado Democrático de Direito. Por outro lado, o mesmo entendimento pode estimular estratégias de blindagem patrimonial, incentivando o esvaziamento ou até o encerramento formal da empresa diretamente acionada, transferindo recursos para outras integrantes do grupo que, por não terem sido incluídas desde o início, ficariam protegidas da execução.

No âmbito da Justiça do Trabalho, os efeitos também são relevantes. A tendência é que haja um aumento expressivo na utilização do incidente de desconsideração da personalidade jurídica (IDPJ) como instrumento para alcançar as demais empresas do grupo econômico. Essa prática, embora juridicamente válida, pode tornar a fase executiva mais morosa e litigiosa. Além disso, a decisão do Supremo deve incentivar advogados de trabalhadores a incluir, de maneira preventiva, diversas empresas de um mesmo conglomerado já na fase de conhecimento, o que também pode gerar processos mais volumosos e complexos, sobrecarregando o Judiciário.

Sob a ótica doutrinária, as críticas se dividem em três grandes correntes. A primeira, alinhada à visão majoritária do STF, enxerga na exigência de participação desde o início um reforço à segurança jurídica, entendendo que esse posicionamento está em sintonia com a evolução do processo civil constitucionalizado e com a necessidade de respeitar garantias fundamentais. A segunda, de caráter minoritário, alerta que esse entendimento pode esvaziar a efetividade da execução trabalhista, transformando a proteção ao crédito alimentar em mera formalidade, sobretudo diante de grupos econômicos sofisticados que se utilizam de estruturas empresariais fragmentadas para escapar de condenações. Já a terceira corrente propõe uma solução intermediária: permitir a inclusão da empresa do grupo econômico já na fase de execução, mas condicionar qualquer medida constritiva a um contraditório efetivo, garantindo prazo razoável para defesa prévia antes de bloqueios ou penhoras.

Esse embate doutrinário revela que a decisão do STF vai muito além de uma questão técnica, pois se trata de equilibrar a eficácia da tutela trabalhista com os direitos fundamentais das empresas, redesenhando os contornos do processo do trabalho e da própria execução.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O julgamento do Tema 1.232 pelo STF não é apenas uma discussão técnica sobre grupos econômicos. Ele representa um verdadeiro choque entre valores constitucionais: de um lado, a proteção ao crédito do trabalhador e a efetividade da Justiça do Trabalho; de outro, a preservação do devido processo legal e da segurança jurídica para as empresas.

Independentemente do desfecho final, o posicionamento do STF terá repercussão imediata em milhares de processos suspensos em todo o Brasil e redefinirá as estratégias processuais de trabalhadores, advogados e empresas.

O futuro da execução trabalhista dependerá do equilíbrio que a Corte Suprema conseguirá traçar entre efetividade e garantias constitucionais, em um cenário de crescente complexidade nas relações empresariais e trabalhistas.


[1] Graduado em Direito pela Faculdade de Direito de Curitiba. Pós-Graduado em Direito Trabalho e Direito Previdenciário na Atualidade, pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, PUC Minas, Brasil. Pós-graduado em Direito Trabalho e Processo do Trabalho, pela Universidade Estácio de Sá, UNESA, Brasil. Pós-graduado em EAD e Novas Tecnologias, pela Faculdade Educacional da Lapa, FAEL, Brasil. Mestre em Cultura Jurídica: Segurança, Justiça e Direito, pela Universidade de Girona, UDG, Espanha. Doutorando em Direito do Trabalho, pela Universidade de Buenos Aires, UBA, Argentina. Membro da Comissão de Direito do Trabalho da OAB/PR (Gestão 2025-2027). Membro da Comissão de Compliance e Governança Jurídica da OAB/PR (Gestão 2025-2027). Advogado e sócio da Oliveira, Hoffmann & Marinoski – Advogados Associados.

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