É sabido que, ocorrendo a morte de uma pessoa, por um princípio jurídico chamado “saisine”, os bens da herança do de cujus são transmitidos desde logo para seus herdeiros legítimos.desequilíbrio
Contudo, resta previsto também, em nossa legislação brasileira que cabe aos interessados na herança promoverem a abertura de inventário, o qual atualmente poderá ser proposto na forma judicial ou ainda extrajudicialmente (nos casos em que todos os herdeiros são maiores, capazes e estiveram de acordo com a partilha dos bens da herança). Sendo que, por sua vez, nas condições regulares e normais, os herdeiros terão direito de uso e fruição dos bens da herança, tão somente após a partilha.
O que vemos, na práxis jurídica, sendo certo que muitas vezes, principalmente nos casos dos inventários judiciais, em que é instaurado o litígio entre os herdeiros, havendo desentendimento entre os herdeiros, o procedimento judicial é extremamente lento, podendo até mesmo demorar alguns anos.
Todavia, o que muitos ainda não tem conhecimento é que nossa legislação processual inovou, prevendo assim à possibilidade de que se possa requerer a chamada antecipação do direito de uso e fruição dos bens da herança.
Tal possibilidade de antecipação do direito de uso e fruição dos bens da herança, resta prevista no disposto no § único, do art. 647 do Código Civil, in verbis:
Art. 647. Cumprido o disposto no art. 642, § 3º , o juiz facultará às partes que, no prazo comum de 15 (quinze) dias, formulem o pedido de quinhão e, em seguida, proferirá a decisão de deliberação da partilha, resolvendo os pedidos das partes e designando os bens que devam constituir quinhão de cada herdeiro e legatário.
Parágrafo único. O juiz poderá, em decisão fundamentada, deferir antecipadamente a qualquer dos herdeiros o exercício dos direitos de usar e de fruir de determinado bem, com a condição de que, ao término do inventário, tal bem integre a cota desse herdeiro, cabendo a este, desde o deferimento, todos os ônus e bônus decorrentes do exercício daqueles direitos. (grifo nosso)
Da leitura do referido dispositivo legal, alveja-se, pois, que para que seja deferido o direito de uso e fruição da herança, deve-se obedecer a duas condições: a) quando do término do inventário, o bem recebido por antecipação para uso e fruição deve integrar a cota do herdeiro que requerer a antecipação; e b) o herdeiro em favor de quem se antecipou a herança deve suportar todos os ônus e bônus decorrentes do exercício dos direitos de uso e fruição.
À primeira vista, tais regras são bastante salutares. Entretanto, não devemos esquecer que o juiz da causa, pode ou não deferir o pedido, devendo-se ainda analisar todas as circunstâncias fáticas, postas pelas partes na lide.
Ao passo que, o permissivo legal ora em questão, é bom, na medida que determinados bens da herança podem se deteriorar ao longo do tempo da tramitação processual, principalmente nos casos que há litígio entre os herdeiros, e assim com o deferimento da antecipação dos direitos de uso e fruição, tais bens do espólio podem ser preservados, sem que isso acarrete em desiquilíbrio na partilha, posto que uma vez adiantado, ou antecipado, ao final do inventário tal bem será descontado do quinhão hereditário recebido pelo herdeiro.
Se faz mister, aduzir contudo, que a aplicação da antecipação do direito de uso e fruição dos bens da herança, nos parece um pouco mais delicada e complexa, nos caso por exemplo nos quais o de cujus, tenha por exemplo deixado quotas de uma sociedade empresarial lucrativa, e, além disso, deixou 03 (três) imóveis que se encontravam locados, os quais a renda da locação não chega a 50% (cinquenta por cento), exemplificadamente, da renda das quotas sociais.
Na hipótese em questão, é de ocorrência muito comum aplicar-se assim o disposto no § único, do art. 647, sendo tal prerrogativa legal extremamente útil, na medida que se pode antecipar, em favor do herdeiro que já estava na frente da sociedade empresária, as quotas sociais, as quais serão futuramente, consideradas como parte de seu quinhão hereditário.
Ora, podemos num primeiro momento, ainda pensar que em havendo rendimento das quotas sociais, o herdeiro que com elas ficar terá, em razão da dicção legal, terá o direito a todos os ônus e bônus decorrentes justamente do exercício antecipado dos direitos de uso e fruição.
Porém, nos parece que a renda (lucro) das cotas sociais, não pode ser confundida com o chamado “pro labore”, definido para aqueles que efetivamente laboram na sociedade empresária. De modo que, parece justo que eventual renda (lucro) das cotas sociais, não deve pertencer tão somente aos herdeiros que estão exercendo a antecipação do direito de uso e fruição de tal bem da herança, em detrimento dos demais herdeiros, os quais em nosso exemplo, ficaram com a renda da locação dos imóveis, sendo que não teríamos igualdade de percepção dos frutos da herança.
Conforme visto, a regra processual é bastante salutar para os casos de conservação dos bens do espólio, porém quando considerada sua aplicação no âmbito das sociedades empresárias, o juiz da causa deve ficar atento para evitar a ocorrência de desigualdades não relação ao bem em si, mas em face do potencial de frutos que se pode obter, podendo com isso, privilegiar-se um ou mais herdeiros, em detrimento dos demais.
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