Dispensa por Justa Causa do empregado que recusa a se vacinar – Análise e Confirmação pelo TRT2
Ainda que considerado tema sensível, temos que analisar de maneira objetiva os fatos e as razões pelas quais inicia-se o processo de judicialização de temas como a aplicação de justa causa a trabalhadores que se recusam a ser vacinados contra a COVID-19.
Com a infeliz evolução do vírus diversos dispositivos legais foram inseridos com o intuito de haver controle da disseminação do vírus, sendo uma das normas editadas a lei 13.979 de 06/02/2020, que dispõe sobre as medidas de enfretamento do vírus que ainda era desconhecido e que estava avançando ao redor do mundo.
Dentro da lei mencionada acima, devemos destacar dois pontos específicos para o tema da vacinação
Art. 1º Esta Lei dispõe sobre as medidas que poderão ser adotadas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019.
§ 1º As medidas estabelecidas nesta Lei objetivam a proteção da coletividade.
Art. 3º Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional de que trata esta Lei, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, entre outras, as seguintes medidas:
I – isolamento;
II – quarentena;
III – determinação de realização compulsória de:
a) exames médicos;
b) testes laboratoriais;
c) coleta de amostras clínicas;
d) vacinação e outras medidas profiláticas; ou
O parágrafo primeiro menciona já sobre que a lei dispõe sobre medidas para a coletividade e que dentro das medidas de enfrentamento se tem a vacinação, conforme artigo 3º.
Com a edição da lei e entendermos melhor sobre o reflexo na justiça do trabalho e a necessidade de vacinação, deve-se entender a importância do julgamento do STF realizado no ano de 2020.
A vacinação obrigatória de maneira compulsória se deu através do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal a partir de três ações (ARE 1.267.897 e ADI 6.586 e ADI 6.587) que tramitavam buscando a discussão quanto a lei 13.979/2020, em especial o seu artigo 3º o qual fora trazido acima.
Tal julgamento estabeleceu o entendimento que o Estado pode determinar que os cidadãos sejam vacinados de maneira compulsória, desde que não exista nenhuma forma de medidas coativas ou invasivas.
Com o entendimento firmado e sendo conferida a obrigação de vacinação de maneira compulsória como medida de contenção do vírus, bem como ser medida imposta para o bem da coletividade, se tem a ideia de que a vacinação é a forma de contenção do vírus e a maneira eficaz de proteção coletiva.
Tal entendimento acaba superando que o princípio da autonomia individual, de maneira que o bem-estar da coletividade está acima de uma garantia individual de autonomia.
Ao analisar o julgamento ocorrido no Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região se tem um caso concreto de aplicação dos preceitos e sobreposição do bem-estar coletivo sobre a autonomia individual ao menos no que diz respeito ao Direito do Trabalho.
Assim, no caso em que ocorreu julgamento sobre a possibilidade de justa causa, se tem uma auxiliar de limpeza que prestava serviços praticamente que exclusivos a um hospital.
Tal funcionária estava diariamente em alto nível de exposição do vírus, tanto para transmitir a pacientes e outros empregados do local, quanto para receber o vírus.
Ao ser disponibilizada vacinação ao público em que esta empregada se encontrava, a mesma deixou de se vacinar, ainda que havido grande quantidade de informação quanto a vírus e a vacinação pelo empregador.
Com a recusa da vacinação, o empregador demitiu a empregada por modalidade de justa causa, enquadrando o fato ocorrido como “ato de indisciplina e insubordinação” o que está inserido nas modalidades trazidas pelo artigo 482 da Consolidação das Leis do Trabalho.
A partir da demissão a ex-empregada ingressou com ação para buscar a reversão da justa causa, tendo seu pedido negado em 1ª e 2ª instância, confirmando assim a justa causa aplicada a empregada pela recusa desse vacinar.
Aqui cabe destacar parte da sentença de 1ª instância em que a juíza Isabela Flaitt sobre dois pontos específicos de sua sentença:
“Saliento que é dever do empregador propiciar condições dignas e decentes aos seus trabalhadores, observando as normas afetas ao meio ambiente de trabalho, visando sempre a tutela da dignidade, saúde e integridade física e psíquica daqueles que lhe prestam serviços, a teor do que dispõem os arts. 1º, III, 6º, 7º, inciso XXII, 200, VIII e 225, parágrafo 3º, da Constituição Federal e art. 157, I, da CLT.”
[…]
Logo, a necessidade de promover e proteger a saúde de todos os trabalhadores e pacientes do Hospital, bem como de toda a população deve se sobrepor ao direito individual da autora em se abster de cumprir a obrigação de ser vacinada.
A primeira parte trazida da sentença traz o dever do empregador em propiciar condições dignas de trabalho a todos os seus empregados, de maneira que o ambiente do trabalho seja preservado.
Esta referência é necessária para entender que a empresa tem o dever de resguardar todos seus empregados, constitui um dever da empresa, imposição e uma obrigação.
No segundo ponto trazido pela magistrada se tem a ideia de proteção coletiva fora da empresa, o que vai de encontro com o entendimento do STF sobre as medidas de proteção contra o vírus serem determinadas a toda a população.
Com a decisão de improcedência do pedido da reversão da justa causa, a autora recorreu ao TRT da 2ª Região a qual confirmou a sentença de 1ª instância de maneira unânime.
Referência
Acordão 13ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região – Relatoria do Desembargador Roberto Barros da Silva – Número do processo: 1000122-24.2021.5.02.0472.