As dívidas da população brasileira, em sua maioria, têm origem nos juros cobrados em modalidades como o cartão de crédito, cheque especial, financiamentos, empréstimos, entre outros. Esses montantes tendem a crescer a uma taxa insustentável, colocando o consumidor em uma posição desfavorável no âmbito das suas finanças. Não raro, esses contratos contêm taxas de juros e cláusulas que podem ser consideradas abusivas e, portanto, sujeitas a questionamento judicial por meio de uma ação revisional.
É essencial que o consumidor seja capaz de detectar juros e encargos abusivos em seus contratos para salvaguardar suas finanças. Uma maneira de verificar a existência de juros abusivos é analisar se a taxa de juros aplicada está em conformidade com as diretrizes estabelecidas pelo Banco Central. Dessa forma, será possível determinar que os juros são abusivos se a taxa exceder significativamente a média de mercado praticada na época em que o contrato em questão foi firmado.
Contudo o que fazer quando detectado que o contrato possui juros abusivos? Conforme o parágrafo XXXV do artigo 5º da Constituição Federal, todo cidadão tem o direito de buscar a revisão de seus contratos na Justiça. Além disso, o inciso IV do artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor proíbe cláusulas que “estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, coloquem o consumidor em desvantagem exagerada ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade”.
A ação revisional tem como objetivo revisar as cláusulas presentes em um contrato firmado entre o consumidor e a instituição financeira, com o intuito de evitar abusos e limitar a taxa de juros aplicada, além de restringir ou anular outras cláusulas consideradas abusivas conforme o Código de Defesa do Consumidor, além dos temas repetitivos com testes firmadas pelo STJ, vejamos algumas:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO Constatada a multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, foi instaurado o incidente de processo repetitivo referente aos contratos bancários subordinados ao Código de Defesa do Consumidor, nos termos da ADI n.º 2.591-1. […]
ORIENTAÇÃO 1 – JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada ? art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.
ORIENTAÇÃO 2 – CONFIGURAÇÃO DA MORA a) O reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descarateriza a mora; b) Não descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência contratual.ORIENTAÇÃO 3 – JUROS MORATÓRIOS Nos contratos bancários, não-regidos por legislação específica, os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês.
ORIENTAÇÃO 4 – INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES a) A abstenção da inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes, requerida em antecipação de tutela e/ou medida cautelar, somente será deferida se, cumulativamente: i) a ação for fundada em questionamento integral ou parcial do débito; ii) houver demonstração de que a cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; iii) houver depósito da parcela incontroversa ou for prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz; b) A inscrição/manutenção do nome do devedor em cadastro de inadimplentes decidida na sentença ou no acórdão observará o que for decidido no mérito do processo. Caracterizada a mora, correta a inscrição/manutenção.
ORIENTAÇÃO 5 – DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO É vedado aos juízes de primeiro e segundo graus de jurisdição julgar, com fundamento no art. 51 do CDC, sem pedido expresso, a abusividade de cláusulas nos contratos bancários. Vencidos quanto a esta matéria a Min. Relatora e o Min. Luis Felipe Salomão.
II- JULGAMENTO DO RECURSO REPRESENTATIVO (REsp 1.061.530/RS) …[1]
De acordo com o artigo 42 do CDC, “o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.” Em suma, o consumidor tem o direito de ser reembolsado em dobro pelo que pagou indevidamente.
Desta feita, a ação revisional pode abranger uma ampla variedade de contratos, sendo os mais comuns aqueles relacionados a cartões de crédito, financiamentos, cheque especial, CDC, empréstimos, leasing, alienação fiduciária e outros que envolvam taxas de juros e cláusulas consideradas abusivas.
Contudo, para propor uma ação revisional por juros abusivos deve-se atentar ao prazo, conforme a interpretação do Poder Judiciário, o consumidor pode solicitar a revisão contratual enquanto o contrato estiver em vigor, e até mesmo dentro de um prazo de até dez anos após o vencimento da última parcela. Como assim prevê a jurisprudência do STJ:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATOS DE MÚTUO. PRESCRIÇÃO DECENAL. TERMO INICIAL. DATA DA ASSINATURA DO CONTRATO. REPACTUAÇÃO DOS CONTRATOS. ASSINATURA DO ÚLTIMO CONTRATO RENOVADO. SUCESSÃO NEGOCIAL. RECURSO ESPECIAL. PROVIDO. 1. Recurso especial interposto em 09/11/2020 e concluso ao gabinete em 11/04/2022. 2. Cuida-se de ação revisional de contratos. 3. O propósito recursal consiste em determinar o prazo prescricional de contratos que tiveram sucessão negocial. 4. A jurisprudência desta Corte é firme em determinar que o termo inicial do prazo prescricional decenal nas ações de revisão de contrato bancário, em que se discute a legalidade das cláusulas pactuadas, é a data da assinatura do contrato. 5. Havendo sucessão negocial com a novação das dívidas mediante contratação de créditos sucessivos, com renegociação do contrato preexistente, é a data do último contrato avençado que deve contar como prazo prescricional. 6. Recurso especial provido.[2]
Adicionalmente, mesmo se o contrato já tiver sido quitado ou encerrado, é possível revisá-lo, pois há situações em que esses contratos continham diversas cobranças abusivas que poderiam, inclusive, resultar na inexistência de dívida do consumidor perante a empresa.
[1] https://processo.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?b=ACOR&livre=200801199924.REG.%20E%2010/03/2009.FONT.
[2] https://processo.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=2173808&num_registro=202102385580&data=20220519&formato=PDF&_gl=1*17auvsz*_ga*MTExMzg2MDAzNS4xNjkwMzA4MjA3*_ga_F31N0L6Z6D*MTY5NjcyODE1NS4xMi4wLjE2OTY3MjgxNTUuNjAuMC4w